tobor e o amanhecer antecipado em seu dia.

vida simples, pensamento elevado.

segunda-feira, maio 28

Dia torto

Hoje é um dia torto. O peso nos ombros e a canseira das coisas do mundo, balanceiam em falsos passos na linha da vida da palma da minha mão. Acordo de susto e com o susto, me carrego em peso pelas ruas chuviscadas dessa cidade minúscula. Pulo pequenas poças, encaro as grandes e até me sinto um pouco mais vivo. Que contradição. Ontem foi dia de luto ao amor. Quando você começa a pensar demais na pessoa amada como a pessoa não amada, num dá em nada, só em desamor. Pois por ontem, matei-lo. Ou melhor, mandei matá-lo. Covardia. Na garganta o catarro não me deixa explicar. Mas vou continuando, até o barco virar. Dos dias tortos da minha vida, não me recordo de um que eu tenha saído com um sorriso ou com a esperança de dia melhor, mas sempre vêm. Pois sempre atrás de uma nuvem preta, existe o sol, que é eterno. Mas que merda.

quinta-feira, maio 10

Particulamente

Insisto. Insisto no erro se for preciso. Fiz um acordo com ele. Vamos nos descobrir mais revelando mais de dentro através da arte. Cada um faz o seu, o que o outro mandar. Ele me passou a mais difícil das coisas. Tenho que falar de mim. Mas sem traduzir, sem dizer que sou magrelo, ou ainda o óbvio das minhas incertezas. Tenho que mostrar a ele, sem nenhum recurso gramatical, apenas ilustrativo, o meu mundo inteiro. Por onde começo? Pelas incertezas, acho. Talvez pelo vazio que nunca se preenche. Talvez pelo drama que não existe, de fato. É tanta coisa pra dizer. Vou desenhar como uma criança. Acho que é o melhor. Porque pelo menos assim eu expresso a essência, o miolo, a raiz, o fundo do saco, as sementes, o alicerce, a base de tudo, a casca de noz. Vou fazer um mundo meu. Vou mostrar a ele que sei quem eu sou, afinal, eu sou eu. E aqui estou.

quinta-feira, maio 3

Ca

Venho ca, postar algumas palavras. Preciso lavar essa sala antiga, talvez remover os sofas, trocando assim a melhoria das visitas pela grande liberdade do espaco e o conforto de quem chega. Sentar no chao eh mais humano. Vou lavar os pratos, os quais ando fazendo aos pouquinhos (mas eh que preciso lavar tudo de uma vez?). Armar as redes e tirar toda aquela poeira do piano. Minha nossa, faz tempo que nao piso aqui. Tava viajando. Em outro pais.

Vinagrette

- Entao, o Carlos me chamou pra aquele churrasco.
- Sei.
- Ai eu falo: "Pow Carlos, tu eh um pilantrinha mesmo, hein? Como tu me chama dois dias antes?"
- Hum.
- Ai ele olha pra mim com uma cara de palerma e fala: "Ah Adalberto, tu num precisa ir nao, cara."
- Hum.
- Ai, porra, eu virei jah indignado: "Entao porque congas d'agua tu me convidou, oh babaca!"
- ...
- Ai ele ficou puto tambem, neh? "Babaca eh a sua mae, seu filho da puta"
- ...
- "Ah, eh? Pois saiba que es adotado, infeliz! Nem mae babaca tu tens!"
- ...
- Ai, ele se calou. Eu me calei tambem. Falei merda.
- ...
- Passa a Vinagrette, por favor.
- ...
- Obrigado.
- Hum.
- ...
- ...
- Tah gostoso.
- ...
- Porra, vou ligar pro Adalberto. O miseravel nem mae tem.


Hugonaldo

Existiam 34 horas pro Hugonaldo. Ele se virava por ai. Arranjava tudo que eh freelance. Vendia relogio, comprava umas cervas pros meninos ricos, traficava cigarros bolivianos e ateh se envolveu com rock, mas aquela galera era muito "sinistra", como ele mesmo rotulava. Hugonaldo era o tipo do cara camisa listrada e correntinha de ouro. O mocassim era tao velho que ele arrumou numa feira na Lapa na decada de 70, brinca? Hugonaldo lustrava moveis em antiquario, carregava sacolas pras velhinhas e um dia ateh alimentou umas orcas selvagens num show aquatico de gringos do norte, coisa que ele disse que era super "izi". Esse tal malandro viveu em bares como o Milindrinha, o antigo Jose Ronaldo Bar, o base do samba Girassol e muitos botecos de fim de noite da antiga varzea, mas que ele dominava na sorrateira ginga do malandro de palito de dente. Hugonaldo era aquele cara que cospia e assobiava uma cancao pra queda da saliva no chao. Era bonito, fazia bem feito. Morreu de morte matada, numa noite de carnaval, numa esquina esquisita da qual sempre evitava a curva, por um outro malandro regional, segurando uma garrafa de pisco e mascando tabaco argentino que ele roubou de um marinheiro velho. Foi feliz, nao comeu ninguem, mas foi feliz. Viva Hugonaldo!